sábado, 17 de novembro de 2018

A Gaveta de Baixo

“Guardei na gaveta de baixo
a flor que trazia nos dedos
à hora de adivinhar-te.

Primeiro
foste apenas uma ideia
que me segurou na porta
da cozinha quando ia
meter numa garrafa verde
um malmequer amarelo.

Fiquei ali
à espera que te transformasses
em certeza ou em música.

Lembro-me que havia um sol bonito
a enquadrar a cesta dos pimentos

Lembro-me do chiar mansinho
da panela da sopa

Lembro-me do gato.

Olhou-me
e li nos seus olhos feiticeiros
o recado que os teus ainda não podia dar-me

sou que tinhas sido arremessado à praia do meu corpo pela espuma desfeita
das vagas de setembro.

Como um grão de areia
uma pepita de ouro
um búzio

Pude então mover-me andar
sorrir de novo
abrir a gaveta de baixo

guardar a flor do meu segredo.” 

Rosa Lobato de Faria

Sem comentários:

Enviar um comentário