O homem do sindicato voltou com a conversa dos direitos. Foi
decidido em plenário ignorarmos a doutora e continuarmos a ir trabalhar todos
os dias. Sim, agora as reuniões passaram a plenários. A gente pequena está
eufórica. Sentem-se a melhor classe operária do mundo. Coitados. Até lhes
começamos a achar graça. Sentados, muito direitos, muito atentos, a tentar
processar, com os dois neuroniozinhos que Deus lhes deu, os palavrões dos
direito e da luta que o homem do sindicato e os amigos que apareceram para
animar a revolta vão gritando dos fundos do refeitório. Pela primeira vez
alguém lhes dirige a palavra e não é para lhes dar uma piçada. Vivem momentos
históricos. Os trabalhadores unidos vão ser todos despedidos.
(…) Achamos curioso estarmos em greve se estamos todos
despedidos. Não sabíamos que era possível estarmos no olho da rua e ao mesmo
tempo protestarmos pela falta de condições de trabalho que não existe. É que
nem estamos a protestar contra os despedimentos, estamos ainda na fase de
reclamações contra os salários em atraso. (…) No último plenário ainda
confirmámos com o grande líder se não era preciso termos trabalho para reclamar
a falta de pagamentos. Disse-nos que eram detalhes técnicos irrelevantes e o
que o que interessava eram os direitos dos trabalhadores.
mas quem não tem trabalho tem direitos
sobre o trabalho que não tem?
os
trabalhadores têm sempre direitos
E
quando não têm trabalho também são trabalhadores?
São, pois, são trabalhadores
oprimidos.
oprimidos por quem?
por quem os despediu
oprimidos por quem?
por quem os despediu
e
isso não faz deles desempregados?
um trabalhador de verdade nunca está desempregado
um trabalhador de verdade nunca está desempregado
e
quando tá sem trabalho?
está
a ser injustiçado pela classe patronal, que só pensa no lucro, mas nem por isso
deixa de ser quem é, quem nasce trabalhador
morre trabalhador
é como se fosse uma deficiência, atão.
Em
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